eu não vou relaxar!

Todo mundo me diz: "chega uma hora na vida que você tem que abrir mão do selvagem dentro de você para manter amigos, empregos e constituir família. Ou você pode escolher ser um louco e viver sozinho.” Acho que todos têm razão. E venho tentando, com orações dadas pela minha mãe desesperada com meu jeitinho nada meigo, ser uma pessoa mais equilibrada. Pura verdade, quando minha auto-estima está em suas piores fases, é aí que a coisa pega: fico com mania de perseguição, acho que tá todo mundo querendo foder comigo, que existe um complô universal contra mim. Bobagem.  Mas a verdade é que eu odeio o equilíbrio. Porra, se eu tô puta, eu tô puta! Se eu tô com ciúme, não vou sorrir amarelo e mostrar controle porque preciso parecer forte e bem resolvida. Se o filho da puta que senta do meu lado é um filho da puta, eu não vou fazer política da boa vizinhança, eu vou mais é libertar essa verdade de dentro do meu fígado: você é um grandessíssimo filho de uma puta! O sangue ferve aqui dentro, e eu não tô a fim de transformá-lo num falso líquido rosa. Eu não tô a fim de respirar e contar até 100, quero morder o puto do meu namorado que apenas sorri seguro enquanto eu me desfaço em desesperos porque amar dói pra caralho, quero colocar TODAS as pessoas que falam “Fala, floRRRR!” numa câmera de gás peristáltico.Podem ter razão, mas é tão difícil ver todos vocês acordando de manhã sem nada na alma, é tão difícil ver todos os casais que só sobrevivem na cola de outros casais, é praticamente impossível aceitar que as contas do final do mês valham a minha bunda sentada mais de 8 horas por dia pensando o quanto eu odeio essa gente que se acha “super” mas não passa de vendedor de sabonete ambulante. É tão difícil ser mocinha maquiada em vestido novo e sapato bico fino. Parem de sorrir automaticamente para tudo, humanos filhos da puta, admitam que vocês não fazem a menor idéia do que fazem aqui. Admitam a dor de estar feio, e admitam que estar bonito não adianta porra nenhuma. Eu já me senti um lixo de pijama com remela nos olhos, mas nunca foi um lixo maior do que me senti gastando meu dinheiro numa bosta de salão de beleza enquanto crianças são jogadas em latas de lixo porque a total miséria transforma qualquer filho de Deus em algo abaixo do animal. Mas eu não faço nada, eu continuo querendo usar uma merda de roupinha da moda numa merda de festinha da moda no meio de um monte de merdas que se parecem comigo. Eu quero feder tanto quanto eles para ser bem aceita porque, quando você faz parte de um grupo, a dor se equilibra porque se nivela. E eu continuo perdida, sozinha, achando tudo falso e banal. Acordando com ressaca de vida medíocre todos os dias da minha vida. Você muda a estação do rádio para não reparar que a menina de dez anos parada ao lado, já tem malícia, mas não tem sapatos. Você dá mais um gole no frisante para não reparar que a moça da mesa ao lado gostou do seu namorado, e ele, como qualquer imperfeito ser humano normal, gostou dela ter gostado.Você disfarça, a vida toda você disfarça. Para não parecer fraco, para não parecer louco, para não aparecer demais e poder ser alvo de crítica, para ter com quem comer pizza no domingo, para ter com quem sair na sexta à noite, para ter quem te pague a roupa nova e te faça sentir um bosta e para quem te pede socorro, você disfarça cegueira.Você passa a vida cego para poder viver. Porque enxergar tudo de verdade dói demais e enlouquece, e louco acaba sozinho. Vão querer te encarcerar numa sala escura e vazia, ninguém quer ter um conhecido maluco que lembra você o tempo todo da angústia da verdade e de ter nascido. Você passa a vida cego, mentindo, fingindo, teatralizando o personagem que sempre vence, que sempre controle, que sempre suporta, que sempre se resguarda e nunca abre a portinha da alma para o mundo. Só que a sua portinha um dia vira pó, e você morre sem nunca ter vivido, e você deixa de existir sem nunca ter sido notado. Você é mais uma cara produzida na foto de mais uma festa produzida, é um coadjuvante feliz dessa palhaçada de teatro que é a vida. Você aceitou tudo, você trocou as incertezas da sua alma pelas incertezas da moça da novela, porque ver os problemas em outros seres irreais é muito mais fácil e leve, além do que, novela dá sono e você não morre de insônia antes de dormir. Você aceita a vida, porque é o que a gente acaba fazendo para não se matar ou não matar todos os imbecis que escutam você reclamar horas sem fim das incertezas do mundo e respondem sem maiores profundidades: relaaaaaaaaaaaaaxa! Eu não vou relaxaaaaaaaaaaaaaaaaaar. Eu não vou abaixar a minha cabeça SEMPRE e aceitar tudo o que as pessoas querem que eu aceite. Respeito é bom e eu também gosto!

T.B. adaptado.

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